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Brasil

ÁUDIO: 'Ai! Credo, doeu!', diz ex-mulher de juiz ao ser agredida e xingada de 'cachorra mentirosa'

Gravações feitas por Michella Marys, ex-mulher de Roberto Caldas, revelam rotina de agressões e insultos

BRASÍLIA - Áudios obtidos pelo GLOBO na tarde deste sábado revelam a rotina de agressões físicas, xingamentos e humilhações psicológicas vivida por Michella Marys Pereira, ex-mulher do juiz Roberto Caldas, integrante da Corte Interamericana de Direitos Humanos . Foi a própria Michella quem fez as gravações. Em uma delas, quando os dois aparentemente estavam dentro de um carro, ele xinga a mulher e há um barulho de uma pancada seguido de uma reclamação de dor.

— Eu não menti nada! — diz ela, durante a discussão.

— Sei! — responde o homem, na gravação.

Ouve-se então o barulho e xingamentos:

— Cachorra, mentirosa!

— Ai! Credo, doeu! — reclama Michella.

— Mentiu o caralho! Foda-se — responde o marido.

Áudios obtidos pelo GLOBO mostram uma rotina de agressões físicas e verbais sofridas por Michella Marys Pereira. O algoz era seu ex-marido, Roberto Caldas, juiz da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Foi a própria Michella quem fez as gravações. Em uma delas, quando os dois aparentemente estavam dentro de um carro, ele a xinga e há um barulho, para em seguida ela reclamar de dor.
Áudios obtidos pelo GLOBO mostram uma rotina de agressões físicas e verbais sofridas por Michella Marys Pereira. O algoz era seu ex-marido, Roberto Caldas, juiz da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Foi a própria Michella quem fez as gravações. Em uma delas, quando os dois aparentemente estavam dentro de um carro, ele a xinga e há um barulho, para em seguida ela reclamar de dor.

A notícia das agressões foi publicada pela revista "Veja". Na última quarta-feira, conforme revelou a revista, o magistrado compareceu ao 1º Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, em Brasília, onde tramita um processo sobre o caso. O Ministério Público chegou a pedir que o Juizado concedesse uma medida protetiva para proibir que o advogado se aproximasse da mulher, mas o juiz negou por considerar que Caldas já saiu de casa e porque, para o magistrado, as questões que envolvem o casal são "aparentemente" financeiras.

De acordo com a revista, o juiz é acusado de injúria, agressão, espancamento e ameaça de morte por Michella Marys. Sobre Roberto Caldas recairia ainda a acusação de assédio sexual a duas babás de seus filhos. O advogado do juiz, Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, nega que seu cliente tenha agredido a mulher.

Na sexta-feira, o advogado Roberto Caldas pediu licença do cargo de juiz da Corte Interamericana de Direitos Humanos por tempo indeterminado. Conforme a assessoria do juiz informou, a licença foi pedida depois que a reportagem foi publicada, para que ele se dedique à própria defesa. Em e-mail enviado a todos os integrantes da Corte, Roberto Caldas afirma que pede licença, "por razões particulares", e que prestará maiores esclarecimentos "oportunamente".

'QUERO QUE VOCÊ ENJOE DE MIM'

Numa outra gravação, a voz identificada por Michella como sendo de Caldas usa uma coleção de palavões para reclamar da bagunça na casa dos dois. Diz que não vê a mulher fazer nada. Critica o fato de ela ir à academia de ginástica cinco vezes por semana no meio do dia e do que gasta com terapia. Também se queixa que os filhos ficam sob o cuidado das empregadas. A discussão é interrompida por outro barulho que sugere agressão.

— Ai, Roberto — diz ela.

A briga durante a madrugada continua. O homem fala que sairá de casa e que o casamento é a única coisa ruim na vida dele. Xinga a mulher de "doida", 'burra", "egoísta" e "ralo de dinheiro". Michella pede que as ofensas parem e que a conversa siga de forma civilizada. Reclama também dos xingamentos feitos em frente aos filhos. Fala que depois de ele chamá-la de "bandida e calhorda", a filha caiu em prantos.

O marido ignora o pedido e segue com ataques por causa da gestão da casa. Queixa-se até das lâmpadas escolhidas por ela porque gastam energia demais. Fala das câmeras que não funcionam porque, segundo ele, Michella não queria que ele visse o que acontece em casa.

— Eu quero que você voe da minha vida. Que você enjoe de mim porque eu sou agressivo — fala o juiz.

— Eu acho que você está muito estressado e vou te desculpar por isso. Você está muito estressado,  sem dormir e vou tentar compreender você — diz Michella.

— Eu estou mesmo — conclui o magistrado da Corte Interamericana de Direitos Humano, que ainda diz: — Michella, sai daqui que eu estou a ponto de explodir em cima de você. Estou nervoso porque sou infeliz com você.

A discussão termina porque Michela sai do quarto do casal.

— Vou só pegar o meu travesseiro — fala a mulher.

Em outa gravação, ele grita aos berros:

— Saia daqui, saia desta casa, saia imediamente! Saia, saia, Michella! Você nunca fala a verdade para mim!  Saia, saia de casa, você é uma bandida! Saia de casa!

— Não vou sair! — respondeu ela.

— Saia, saia de casa! Você é uma mentirosa, vive na mentira! — respondeu ele.

TESTEMUNHO DE FUNCIONÁRIOS DOMÉSTICOS

Em 13 de abril de 2018, Michella foi ao cartório juntamente com empregadas deixar registrado agressões sofridas em 23 de outubro do ano passado. Esse dia, segundo Michella, marca o momento em que ele também passou a agredi-la fisicamente na frente dos outros. Em ocasiões anteriores, ele já a ofendia diante dos outros, mas batia apenas quando os dois estavam a sós.

"Declarou que embora ele sempre se descontrolasse apenas quando estavam a sós e no ambinete do quarto para não deixar vestígios e testemunhas e que este nunca havia perdido o controle de agredi-la fisicamente em frente a amigos ou empregados, mas que já a tinha xingado de algumas coisas em frente de alguns empregados, inclusive estas três afirmaram que o viam constantemente tratando a declarante com ignorância e de forma muito grossa", diz trecho da ata notarial. "A solicitante afirmou que teve medo de ir à delegacia, pois, além de não querer terminar com o casamento, sempre foi dependente financeiro e emocionalmente do marido, e também tinha medo da repercussão, já que ele era pessoa reconhecida internacionalmente e dizia", acrescentou trecho da ata.

Numa outra gravação, Michella conversa com uma amiga sobre a vergonha dos atos do marido enquanto prepara o jantar. Roberto chega e reclama que ela não deveria cozinhar porque a empregada tinha de deixar o que comer. Quando descobre que a cozinheira tinha preparado macarrão para deixar no fim de semana, ele começa os ataques contra a esposa.

'SÓ TEM IDIOTA AO MEU LADO'

– Você não tem voz aqui não, Michella? Quando eu viajo, a coisa aqui degringola. É miojo. O menino está só engordando. Você não é mãe, não, para ajudar na dieta? Olha ele comendo aqui.

Michella diz que ele está nervoso por uma discussão que teve mais cedo com uma outra pessoa. Ele rebate imediatamente.

– Estou brigando porque só tem idiota do meu lado. (Diz o nome do homem) e você também.

O juiz se queixa que o filho está gordo e manda a criança jogar o prato de macarrão fora. Diz para o menino que ele está engordando e que vai ter doenças cardíacas e diabetes. E culpa a mulher por tudo. Reclama da quantidade de queijo colocada no prato. Chama a esposa de cega.

– Eu já disse para não fazer massa aqui em casa. Especialmente, de noite. Enquanto o Roberto estiver em dieta, ninguém, entendeu? Ninguém (deve comer massa). Vocês querem comer, comam fora – fala o magistrado, que ataca Michella:

– Se não colabora, por que o menino vai em nutricionista? Idiota. Você é a dona da casa e é mãe. E nem liga que o menino está comendo.

A criança fala que não está mais com vontade. O pai obriga a mudar o prato e manda o menino jantar para não ficar com fome mais tarde.

– Depois está procurando porcaria para ficar bufão.

'CAGA-RAIVA'

Um dos áudios gravados é com uma psicóloga que atendeu um de seus filhos. Michella conta à profissional:

— Quando ele era pequeno, ele tinha o apelido de "caga-raiva". E na adolescência também. Então ele batia muito nos meninos da escola, que era onde desafogava essa raiva. Com o tempo, o que aconteceu? Ele veio aqui para Brasília, foi fazer direito, foi ser um advogado famoso. Ele podia descontar essa raiva na rua com os amigos? Não podia. A fama dele de advogado não ia funcionar. Então ele desconta em mim esse "caga-raiva" dele que ele fazia com as crianças.

No áudio intitulado "ele me bate no início e ainda coloco para gravar ele fazendo essa agressão, dá para perceber no tom de voz o gesto", Roberto chama a mulher de "filha da puta" e "vagabunda". Diz ainda que a casa do casal é dos filhos dele. E que, se Michella quiser, ela que saia. Numa outra gravação, ela tenta registrar uma agressão que teria acabado de acontecer. Ele teria batido nela com o controle remoto da TV.

— Olha aqui o vermelho que está no meu braço da controlada que você deu. Quem não vai dormir aqui é você porque quem me bateu foi você. Não me chama de vaca não.

Num outro episódio, Roberto diz que sairá no dia seguinte e ameaça tirar a guarda dos filhos da mãe:

— Amanhã, eu saio de casa e tiro a guarda dos meninos.

CONVERSA COM OS FILHOS

Michella gravou uma conversa com um dos filhos. A criança diz que se a mãe se divorciar do pai, "a plateia dele cairia muito" e que, provavelmente, ele perderia o emprego. A mulher fala que não tem como provar as coisas que o marido faz porque não tem provas, mas o menino diz que a Justiça vai acreditar no que os filhos disserem.

— Ele me estimula a não gostar dele. Briga com você demais e é bruto — diz a criança, que lembra que o pai ensina que não pode tratar os filhos de modo ruim por causa dos Direitos Humanos.

Numa das gravações, ele disse que ela é uma "bandida com carinha de santa". Fala que depois do divórcio, ele não dividirá os bens:

— Eu não vou te deixar é nada. Vai embora.

Em outro áudio, um dos filhos pede para contar história e a mãe fala que contaria, mas em outro quarto. Uma briga acabara de acontecer no lugar. Roberto chega e começa a gritar e xingar a esposa. Diz que ela é uma "folgada" e "filha da puta". Depois, a criança, que aparenta ser muito pequena, fala com a mãe:

— O papai brigou com você.

— Não. Ele só estava falando comigo — responde a mãe.

Depois disso, ela mãe fala que vai dormir com o filho na cama dele e a gravação é interrompida. Num outro áudio, intitulado de "bate tb", Roberto ataca a esposa:

— Eu não quero ficar sustentando vagabunda não. Você me roubando o tempo todo. Vagabunda. Eu trabalhando para você gastar. Foda-se — brada o agressor e um som de tapa é ouvido em seguida.

— Ai, Roberto. O que é isso?

— Acabou, Michella. Eu te dei todas as chances. E tem mais. Você não vai ver nem cor de filho — ameaça o juiz.

Numa discussão sobre o tratamento dados aos filhos das relações anteriores dos dois, Roberto reclama de uma possível diferença dada por Michella ao filho mais velho de Roberto. Ela nega que haja qualquer mudança e começa a chorar.

— Para de chororô, víbora.