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Crítica: Em bom disco de lados B, Zeca Baleiro revela sua produção industrial característica

Em 'Arquivo_Raridades', compositor reúne inéditas e versões para clássicos da MPB
Zeca Baleiro Foto: Silvia Zamboni / Divulgação
Zeca Baleiro Foto: Silvia Zamboni / Divulgação

RIO — Não se pode piscar que lá vem novidade de Zeca Baleiro: disco de inéditas, DVD ao vivo, trilha sonora, infantil, tributo — até um projeto de música erótica o compositor maranhense de 52 anos já anunciou que estava aprontando (cadê, aliás?). Em tempos de gravações digitais, com a facilidade de se registrar música com boa qualidade, é natural que tamanha workaholiquice gere muito material que acaba não aproveitado, e aí... Ele acaba aproveitado em discos como este “Arquivo_Raridades” (com underscore mesmo).

Algumas músicas são conhecidas, porque são clássicos da MPB em versões caramelizadas — um velho costume de Zeca, sempre fã de uma releitura — ou porque apareceram em projetos mais conhecidos.

“Baioque”, de Chico Buarque, que abre o disco, foi gravada para uma trilha de novela, mas acabou excluída por ser considerada “roqueira” demais (curioso, em uma música que fala “Eu quero partir requebrando rock’n’roll”). A boa guitarra de Tuco Marcondes está lá, mas não chega a assustar a vizinhança, em uma versão deliciosa de uma canção idem.

O caso é parecido com “Por causa de você”, standard de Tom Jobim e Dolores Duran: um violão bem tocado (por Dino Barioni) e um musicão; “Respeita Januário”, de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, ganhou um arranjo soul-funk que se encaixa perfeitamente em sua malandragem nordestina. Por outro lado, Zeca afina a máquina do tempo e relê Rael & Nave, em “Envolvidão”, um rap-MPB no piano, com classe.

O time das inéditas (ou quase) traz um bom painel do Baleiro recente, algo melancólico, como em “A estrada me chama”, levada no violão, e na baladaça “Tardes de abril”, composta na esperança de que Roberto Carlos um dia a grave (“Nunca tive retorno se o cara ouviu”, diz Zeca em um texto sobre o disco). Se o Rei um dia a cantará, ninguém sabe. Mas na voz do Baleiro, ficou linda.

A maior parte do baú fica por conta de uma das características mais marcantes do artista: a garimpagem de joias pouco conhecidas, ou consagradas apenas no âmbito regional. Chico Maranhão, Padre Zezinho, Glauco Luz, a dupla Rafael Altério e Kleber Albuquerque... Lados B da música brasileira em embrulhos luxuosos, como “Vocação”, uma balada-rock poderosa, e “Logradouro”, um name-dropping tristonho de lugares mil, figura fácil nos shows do cantor. Em suma: os lados B, C e até Z de Zeca Baleiro são puro Zeca Baleiro.

Cotação: Bom